A culpa é das elites
Blog "O Jumento" ; Lisboa" ; 16/10/2007
Os portugueses têm uma visão hierárquica da culpa, o culpado de tudo é sempre do que está por cima, se alguém não faz o que deve, desde o cantoneiro ao enfermeiro, o culpado é o chefe superior e assim sucessivamente até ao primeiro-ministro, excluindo-se desta selecção o Presidente da República de quem se espera que confirme que sim senhor, o culpado é mesmo o primeiro-ministro. Tivemos ditadores que não ousamos derrubar e governos que elegemos, mas os culpados foram sempre os que nos governaram.
O empresário faliu? A culpa foi do gestor, no dia seguinte o gestor junta-se aos trabalhadores na afirmação de que a culpa foi do ministro que não ajudou. A produtividade era baixa? A culpa é do ministro do Trabalho que não promoveu a formação profissional. A qualificação profissional não era grande coisa? A culpa é da ministra da Educação. Os produtos chineses são mais baratos? A culpa é do ministro da Economia que não soube impor barreiras tarifárias em Bruxelas.
E como os governos são constituídos pelas elites a culpa é das elites. Somos incultos? A culpa é das elites culturais. Somos mal governados? A culpa é das elites políticas. Temos maus resultados desportivos? A culpa é das elites desportivas. O partido perde eleições? A culpa é das elites do partido. As elites são as culpadas de todos os males, tornam-se o alvo das nossas frustrações.
Somos um povo de cidadãos inimputáveis, ninguém é culpado de nada, as elites é que nos tramam. Ninguém foge ao fisco, a DGCI é que não cobra. Ninguém leva o cão a defecar na rua, a câmara é que não limpa, ninguém se balda no trabalho, o gestor é que é incapaz. Ninguém se esquece de acompanhar os filhos na escola, o professor é que é fraco.
A verdade é que os portugueses têm as elites que merecem e de pouco lhes vai valer vingarem-se nelas. Somos contra elites até porque temos inveja de todos os que são bem sucedido, descobrimos sempre uma boa razão para os que falham e um comportamento criminoso para justificar o sucesso alheio, se não tivermos argumentos recorremos ao azar se formos ateus e à determinação divina se formos crentes.
Não só temos as elites que merecemos como temos as elites que promovemos. Somos um país onde os bons alunos são acusados de marrões, onde os que defendem a mudança são acusados de excesso de protagonismo, onde os mais criativos são apelidados de doidos. Somos um país onde temos medo que o vizinho progrida, tudo fazemos para impor a mediania colectiva.
No fim chegamos sempre à conclusão de que a culpa são das elites. É verdade, temos umas elites da treta, mas são as elites que desejámos, são, portanto, as elites que merecemos.
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